Rumo à COP30: como o BIM está redefinindo a sustentabilidade na construção civil?

por Marcus Granadeiro

Com a 30ª edição da COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas), que acontece em novembro no Brasil, os olhos do mundo  se voltam para o país e para o debate sobre sustentabilidade e responsabilidade climática. Nesse cenário, o segmento da construção civil se  destaca tanto pelo seu impacto quanto pelo seu potencial de transformação. 

Responsável por quase 40% das emissões globais de carbono, segundo dados do relatório Building Materials and the Climate: Constructing a New Future, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP), e do Centro de Ecossistemas e Arquitetura de Yale, a indústria da construção precisa  alinhar suas práticas às metas ESG (Ambiental, Social e Governança) e a boa notícia é que a chave para essa transição já existe e está sendo difundida no mercado.  O Building Information Modeling (BIM) está longe de ser apenas uma ferramenta para criar modelos 3D, se consolidando como um habilitador estratégico de ESG principalmente com a Lei de Licitações (Lei nº 14.133/21), que torna o uso obrigatório em obras no Brasil. 

O modelo fornece um ecossistema de dados que transforma intenções de sustentabilidade em resultados mensuráveis, verificáveis e certificáveis. Assim, adotar o BIM hoje não é uma mera questão de digitalizar o processo, mas sim uma decisão de negócio alinhada a um planejamento estratégico que define o futuro da engenharia.

A jornada para um empreendimento sustentável começa no Plano de Execução BIM (PEB), no qual os objetivos ESG, que envolvem ambiente, social e governança, são explicitamente integrados desde o início. Métricas como energia líquida zero, neutralidade de carbono, segurança do trabalhador e transparência de governança são definidas antes mesmo da primeira pá de terra ser movida. Essa abordagem proativa é fundamental para obter certificações de sustentabilidade e bem-estar social internacionais como LEED (Leadership in Energy and Environmental Design), BREEAM (Building Research Establishment Environmental Assessment Method) e WELL, certificação do International WELL Building Institute (IWBI) que atesta edifícios e espaços projetados para apoiar a saúde e o bem-estar físico e mental dos ocupantes. 

Trago neste conteúdo uma abordagem de como a metodologia contribui para os três pilares que sustentam as metas ESG, traduzindo princípios em ações concretas e resultados mensuráveis.

1. Ambiental (E): construindo com consciência ecológica

No pilar ambiental, os modelos BIM, por meios da interoperabilidade, se conectam a ferramentas de simulação que analisam a eficiência energética, o aproveitamento da iluminação natural, a performance de sistemas de climatização e o potencial de energias renováveis. Isso permite que arquitetos e engenheiros tomem decisões informadas na fase de projeto, reduzindo o “lock-in” de carbono, ou seja, evitando que o projeto nasça com uma alta pegada de carbono já “travada” em seu design.

Além da energia, o BIM revoluciona a gestão de materiais ao permitir a criação de “passaportes” que armazenam dados sobre carbono embutido, toxicidade e potencial de reciclagem. Essa transparência é a base para a economia circular, apoiando estratégias de reuso e reciclagem de componentes e garantindo que os recursos sejam utilizados de forma mais inteligente. A eficiência hídrica também é otimizada, com simulações de captação de água da chuva e reuso de águas.

2. Social (S): edifícios para pessoas

O impacto social de um empreendimento é igualmente importante. O BIM é essencial para o design centrado no ser humano, permitindo análises detalhadas da Qualidade do Ambiente Interno (IEQ). Simulações de iluminação natural, conforto acústico e ventilação garantem espaços mais saudáveis e produtivos para os ocupantes. Na fase de construção, o BIM 4D (voltado para análise de tempo) e 5D (análise de custo) otimizam o cronograma e a logística, reduzindo desperdícios e melhorando a segurança no canteiro de obras.

3. Governança (G): transparência e confiança

Talvez um dos maiores trunfos do BIM no contexto ESG seja a Governança. Ao criar uma trilha de auditoria digital, o modelo rastreia todas as decisões tomadas ao longo do ciclo de vida do projeto, garantindo transparência e responsabilidade. Isso combate o greenwashing, fornecendo métricas ESG verificáveis que aumentam a confiança de investidores e partes interessadas.

Após a entrega, o modelo BIM evolui para um Gêmeo Digital (Digital Twin), que, conectado a sensores IoT (Internet of Things), monitora o desempenho do edifício em tempo real, consumo de energia, água, qualidade do ar e emissões. Essa operação baseada em dados permite a otimização contínua e a geração de relatórios ESG automatizados, alinhados a padrões globais e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU (Organização das Nações Unidas).

À medida que o Brasil se prepara para a COP30, o setor da construção tem a oportunidade de liderar pelo exemplo. A Transformação Digital, impulsionada por marcos como a nova Lei de Licitações, já é uma realidade e a  adoção do da metodologia BIM surge como uma estratégia necessária para a sobrevivência e competitividade no mercado, permitindo que a indústria da construção não apenas cumpra suas obrigações, mas que se posicione na vanguarda da inovação e construa um legado positivo para as próximas gerações.

Marcus Granadeiro é engenheiro civil formado pela Escola Politécnica da USP, membro do RICS - Royal Institution of Chartered Surveyors (MRICS), certificado em Transformação Digital pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e sócio-diretor do Construtivo, empresa de tecnologia com DNA de engenharia, que é parceira em treinamento e certificação da buildingSMART Brasil.